Entre Santibanez de Valdeiglesias e Astorga, lagartas de fogo atravessam grudadas uma estrada de cascalho de 2,5 metros de largura. Unidas, não são mais rápidas, mas enfrentam o vento frio e parecem maiores e mais fortes aos inimigos naturais.
O tempo de quem anda é diferente. Entre você enxergar um ponto desejado adiante e chegar até ele vai demorar o período necessário para você valorizá-lo; vai demorar muito. Viver não é chegar em um lugar. Isso ainda tem um nome mais adequado: morrer.
Garçons europeus reagem com impaciência/desconfiança quando você quer saber o nome deles, mas sempre te atenderão melhor quando chamados pelo nome. Diferente do que sua mãe dizia no Brasil, não se morre ao beber água da torneira do hotel. Respeite 50 centavos de euro como se deles dependesse sua próxima alimentação (é capaz de depender mesmo). Quando for muito bem acolhido, doe 5 euros de gorjeta à dona de um albergue simples. Ela vai ficar tão feliz que não saberá o que falar, e terá certeza que brasileiros são todos especiais e/ou milionários excêntricos.
O menu mais saboroso dos primeiros 400km do Caminho de Santiago está numa cidadezinha de 1098 habitantes, Hospital de Órbigo, e é feito por uma agradável morena de seus 45 anos chamada Maria Palos, servido no restaurante com nome dela. Ela sempre sorri, embora a ciência não tenha descoberto qualquer relação entre alegria e temperos culinários. Sim, brasileiros são especiais.
Você aprende que na Espanha “vale” se pronuncia “bale”, se entende “male”, e significa que está tudo certo. Ah, o menu delicioso de Maria Palos custa 9,50 euros, tornando ainda mais humilhante a diferença de sabor para um de 30 euros, assinado por um chef que é celebridade na Europa inteira.
O caminho não te dá as respostas que você quer; te dá as respostas que você precisa. E, quando você anda, todo o Universo se move ao seu redor e a seu favor. Isso parece muito Paulo Coelho, mas é apenas um negócio que inventaram chamado Física Quântica.